quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

2º FÓRUM DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL – GOIÂNIA-GO - novembro/1998

PRINCÍPIOS E PRÁTICAS EM EA NAS ÚLTIMAS DÉCADAS

Fani Mamede


Parafraseando Aziz Ab’Saber: A EA representa “um chamamento à responsabilidade planetária dos membros de uma assembléia de vida dotas de atributos e valores essenciais: à capacidade de escrever sua própria história informar-se permanentemente do que está acontecendo em todo o mundo: criar culturas e recuperar valores essenciais da condição humana. E, acima de tudo, refletir sobre o futuro do planeta.”

Para falar um pouco sobre o caminho da EA nas últimas décadas, devemos considerar que a humanidade arca hoje com grandes ônus decorrentes do equívocos cometidos, quando se promoveu a injustiça social, a concentração de renda e a degradação ambiental.

Recordando um pouco os conceitos, que a EA não é ecologia, não é ecossistemas, não é qualidade de vida e também não é ecodesenvolvimento. Na Conferência de Tbilisi, em 1977, ela foi definida como “um processo de reconhecimento de valores e clarificação de conceitos, objetivando o desenvolvimento das habilidades e modificando as atitudes em relação ao meio, para entender e apreciar as interrelações entre os seres humanos, suas culturas e seus meios biofísicos. A EA também está relacionada com a prática das tomadas de decisões e a ética que conduzem para a melhoria da qualidade de vida.

Enrique Leff em 1994, amplia mais este conceito quando diz que a EA implica um processo de reflexão e tomada de consciência dos processos ambientais emergentes, que conduzem à participação e ao resgate da cidadania nas tomadas de decisões, conjuntamente com a transformação dos métodos de pesquisa e formação, através dos enfoques interdisciplinares. A EA também propõe gerar a percepção crítica, visando uma intervenção e uma metodologia autônoma na direção de estratégias de desenvolvimento e conseqüente melhoria na qualidade de vida.

Nas últimas décadas percebemos uma evidente mudança de paradigmas no desenvolvimento de trabalhos na área da educação ambiental. Evoluímos de uma vertente ecológica-preservacionista-catastrofista para uma vertente sócio-ambiental-sustentabilista.

Esta nova forma de olhar e trabalhar a ações em EA, reflete um novo caminho no tratamento das questões ambientais por meio da educação. Sabemos que os conceitos, as metodologias, as estratégias da educação ambiental estão em plena construção. O momento é efervescente. Em todo o país novas práticas são iniciadas, avaliadas, transformadas, contextualizadas. Vivemos enfim, um amplo processo de criação.

Para nortear esses processos, a EA identifica seus princípios orientadores: O ambiente deve ser visto como um todo, nos seus aspectos naturais e criados pelo homem (político, social, econômico, científico-tecnológico, histórico-cultural e moral); a EA deve acontecer de modo contínuo e permanente, dentro e fora da escola; deve integrar várias áreas do conhecimento, é multi e interdisciplinar; pensar global e agir local ou agir global pensando nos efeitos locais; insistir no valor e na necessidade da cooperação local, nacional e internacional, para prevenir e resolver os problemas ambientais; contribuir na identificação dos sintomas e das causas reais dos problemas ambientais, desenvolvendo o senso crítico e as habilidades necessárias para resolvê-los.

Para executar suas ações a EA faz uso de várias estratégias, tais como: Informação, formação, divulgação educativa, mobilização, sensibilização, capacitação, comunicação educativa e a campanha educativa.

Orientada por esses princípios e estratégias, a EA vai desenhando o seu caminho de forma única. Não podemos entender que uma educação transformadora, tradução da própria cidadania, tenha a mesma inserção no ensino ou nas ações com a comunidade, que outros temas e matérias fechadas e tradicionais. A EA inova, movimenta e dá uma nova dinâmica nas relações.

Sabemos que entre os objetivos da EA está a promoção da consciência ambiental no ser humano. Ao construir esta consciência ambiental, o ser humano internaliza, compreende e se transforma.

Temos então a ação dos agentes transformadores, com práticas pautadas numa ética planetária solidária e eqüitativa.

Ainda não é o bastante, para que se defina o processo de desenvolvimento da racionalidade ambiental é necessária, finalmente ação qualificada no meio, como define com muito brilhantismo a Profa. Naná Mininni Medina.

Vamos tentar entender a educação ambiental numa nova ordem, ampliada pelas grandes questões ambientais. Primeiramente, observamos as prioridades globais para o tratamento das questões ambientais, quais sejam: escassez, mau uso e poluição das águas; contaminação dos oceanos; exploração excessiva dos recursos marinhos; degradação dos solos; perda da biodiversidade; aquecimento da terra; destruição da camada de ozônio; concentração da população nas cidades; baixa qualidade de vida; falta de tratamento e destinação de resíduos.

Para podermos trabalhar com a EA nestas questões e para compreendermos o processo de construção de um novo modelo de desenvolvimento, precisamos entender quais são os fatores diretos de transformação do meio ambiente. Nas atividades produtivas, temos a indústria, produção agrícola e serviços; a exploração e uso de recursos naturais; infra-estrutura. Nos assentamentos humanos, a questão populacional; a urbanização e metropolização e os assentamentos rurais.

Passamos então a identificar os fatores condicionantes do desenvolvimento:

Capacitação científica e tecnológica; educação e informação; cooperação e mudanças institucionais; trabalho e emprego; políticas macroeconômicas; qualidade ambiental; nova ordem mundial e a globalização dos mercados e distribuição de rendas.

O que concluímos com esta reflexão? Percebemos claramente, a EA permeando e perpassando toda e qualquer ação nessa nova ordem planetária.

Buscamos um novo modelo de desenvolvimento, um modelo sustentável que garanta que todos possam ter acesso aos direitos de cidadania, bens e serviços necessários à uma vida de qualidade. É também aquele que evita o desperdício dos recursos naturais e respeita os limites do meio ambiente, preservando o direito à vida das gerações futuras.

A educação ambiental é sem dúvida alguma a grande ferramenta mundial que prepara o ser humano para essas mudanças. Mudanças que promovam o entendimento desses ideais de sustentabilidade que só podem ser alcançados com a revisão dos nossos valores.

Para falar do real caminho da EA nessa última década, consideramos o ano de 1997 como um marco da EA no país. Vinte anos após a Conferência de Tbilisi. Demoramos para acordar mas agora parece que temos muita pressa de chegar. Essa é a melhor parte.

Em 1997 tivemos os grandes eventos de avaliação e de definição de perspectivas:

·         1ª Teleconferência Nacional de Educação Ambiental – junho/97
·         IV Fórum de Educação Ambiental/I Encontro da Rede Brasileira de Educação Ambiental – Guarapari-ES, agosto/97
·         I CNEA - I Conferência Nacional de Educação Ambiental – Brasília-DF, outubro/97, cujo trabalho coletivo foi apresentado com sucesso na Conferência Internacional sobre Meio Ambiente e Sociedade: Educação e Conscientização Pública para a Sustentabilidade

Durante a I CNEA foi construída a Declaração de Brasília para a Educação Ambiental que uma síntese de caráter nacional que pontua a problemática nacional e identifica as recomendações para subsidiar a política nacional de educação ambiental.

Observamos então, em 1998, que o panorama nacional é de implementação, de práticas locais e principalmente, de muita reflexão, tendo em vista os resultados de 97 que efervesceu em encontros, trocas de experiências, mobilizações e articulações em todo o território nacional. 70% dos estados brasileiros já estão construindo ou implementando seus programas estaduais de educação ambiental, suas diretrizes políticas para a área.

Caminhamos para o novo milênio dando nossos primeiros passos para a garantia do futuro e da preservação da espécie humana.

Cito um trecho da conferência da Profa. Naná Mininni Medina na I CNEA que reflete bem esse nosso desafio: “olhem, quão grande é o desafio. Estamos procurando formar pessoas diferentes, para a construção de sociedades diferentes. Nesse sentido realmente temos que reconhecer que somos muito audaciosos. Mas as conquistas no futuro são dos audazes, então eu acredito que justamente, é bom que nos proponhamos de uma forma muito audaciosa formar o homem do futuro. Vamos errar, claro que vamos errar, mas também vamos aprender com nossos erros.”

Estou chamando a vocês a serem audazes e criativos, mas este ser audaz não implica fazer qualquer coisa em qualquer momento, um ser audaz e criativo de maneira consciente, implica consolidar processos e entender fenômenos, ou seja, processos permanentes de reflexão- ação- reflexão.”

E ela vai mais além, quando diz: “o educador Paulo Freire, nos dizia: ação - reflexão - ação.

Se não somos capazes de refletir sobre a nossa própria prática, se não somos capazes de analisar e avaliar a própria prática, dificilmente seremos capazes de mudá-la.

Finalizo dizendo uma frase de Antonio Machado, que acredito ajustar-se muito claramente a nossa tarefa de educadores ambientais e aos nossos múltiplos e complexos desafios:


“ caminante no hay camino , se hace camino al andar”.

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